14/09/2018

CORRER FAZ MAL! SERÁ?

Sempre que algum corredor se machuca, escuto a seguinte frase:

– Machucou né? É normal, corrida tem muito impacto!

 

Mas será que isso é verdade? Vamos conversar um pouco sobre esta “regra” do mundo running!

 

Teoricamente as lesões da corrida aparecem devido ao impacto das passadas repetitivas durante a prática do esporte, sendo que este impacto não é exclusivo do ato de correr, durante a caminhada ele também estará presente, mas com menor intensidade e sempre sendo proporcional à velocidade, ou seja, quanto maior a velocidade de deslocamento maior será a sobrecarga.

 

Mas o que é esta sobrecarga? É o stress que os tecidos são submetidos a cada passada, principalmente as articulações e os músculos dos membros inferiores. Estudos mostram que a sobrecarga da caminhada varia entre 1,2 a 1,5 vezes o peso corporal do aluno, a cada passada, sendo que essa variação dependerá do piso que é realizada a atividade e da velocidade de deslocamento.

 

Para uma fácil visualização, utilizaremos como exemplo um indivíduo do sexo masculino que pesa 70kg. Durante a caminhada, a cada passada, suas articulações e músculos das pernas serão submetidos a uma sobrecarga entre 84kg e 105kg. Um stress pequeno para nossa estrutura corporal e que nosso organismo suporta tranquilamente, mesmo que por um tempo relativamente elevado.

 

Durante a prática da corrida a velocidade de deslocamento aumenta, consequentemente a sobrecarga aumenta, porém muito menos do que o senso comum acredita, ela varia entre 1,9 e 2,5 vezes o peso corporal. Então para nosso indivíduo que pesa 70kg, a sobrecarga da corrida ficará entre 133kg e 175kg a cada passada. Novamente uma sobrecarga que nosso organismo é capaz de suportar, mesmo por um longo período.

 

"Mas professor, a diferença entre a sobrecarga da caminhada e da corrida é muito grande, nesse exemplo que você citou aumenta até 70kg a cada passada. Então corrida é sim um esporte de impacto e lesivo." Calma! Não é bem assim.

 

Na verdade a corrida em si não é um esporte lesivo como o senso comum afirma, e também não é uma modalidade de alto impacto. Se fizermos uma comparação com outros esportes isso ficará claro. Na aterrissagem dos saltos realizados no basquete, por exemplo, a sobrecarga nas articulações chega a 8 vezes o peso corporal, e no salto triplo do atletismo essa sobrecarga chega a ultrapassar a marca de 15 vezes o peso do indivíduo. Se nosso corredor modelo praticar estas modalidades ele será submetido a sobrecargas de até 560kg no basquetebol e de mais de 1000kg no salto triplo.

 

"Mas então, se a corrida de rua é um esporte de baixo impacto, qual o motivo de existirem tantas lesões relacionadas à sua prática?"

           

As lesões ocorrem devido à prática da corrida de rua com volumes e intensidades exagerados e sem o devido descanso entre os treinos. Por isso é muito importante respeitar a carga de trabalho (volume e intensidade) dos treinos e ter uma recuperação (descanso) adequada entre as sessões de treinamento, principalmente para indivíduos novos no esporte.

           

Se a carga de trabalho for respeitada ficaremos longe das lesões! Um bom exemplo disso são os ultramaratonistas, atletas que chegam a ter volumes de treinamento que ultrapassam os 300km de corrida por semana, mas dificilmente se lesionam. Seus organismos suportam uma carga de trabalho muito elevada, pois durante anos realizaram adaptações progressivas ao esforço, aumentando gradativamente as distâncias dos treinos, e sempre com tempo suficiente para o organismo se recuperar e se adaptar entre os esforços.

           

Se a corrida de rua for praticada da forma adequada, será extremamente benéfica para a nossa saúde, aproveitando momentos muito prazerosos, sem dores e sem lesões, por toda a vida. Vale ressaltar que o desenvolvimento de uma lesão se dá por muitos fatores, então não quero dizer que um atleta que respeita as cargas de treinamento e o descanso adequado nunca desenvolverá uma lesão. Porém a prática desacerbada da corrida é o principal motivo relacionado às lesões, por isso sempre devemos procurar um profissional de Educação Física capacitado e respeitar a prescrição dos treinamentos, para assim podermos diminuir as chances de nos machucarmos.

           

O fortalecimento muscular e uma alimentação equilibrada se mostram muito eficazes na prevenção de lesões, e devem ser incorporados na rotina diária de todo corredor, porém estes assuntos serão tratados em posts futuros.

 

Prof. Marcos Castro

Nascido em Itapetininga, Sorocabano de coração, formado em Educação Física, especialista em Fisiologia do Exercício pela Universidade Federal de São Paulo, Diretor Técnico da Running Lab Assessoria, ultramaratonista e apaixonado por corrida e pela ciência do esporte.